Quando a brincadeira se torna vício?
Especialista explica como
o Tetris pode desencadear comportamento compulsivo
A Organização Mundial da
Saúde (OMS) passou a reconhecer, em 2022, o vício em videogames como uma
condição médica oficial. Com a edição da Classificação Estatística
Internacional de Doenças (CID-11), o distúrbio de games entrou para a lista
como transtorno mental, caracterizado pela perda de controle sobre o impulso de
jogar, a priorização dos jogos em relação a outras atividades diárias e a
persistência no comportamento, mesmo diante de consequências negativas. Segundo
um estudo publicado no Jornal de Psiquiatria da Austrália e Nova Zelândia,
quase 2% da população mundial são afetados pela condição, também chamada
de “gaming disorder”.
Entre os jogos
potencialmente viciantes está o clássico Tetris, sucesso desde os anos 80 e até
hoje presente em consoles, celulares e computadores. Embora pareça inofensivo,
o jogo é um exemplo de como um ciclo simples e repetitivo pode se tornar
compulsivo. “A razão pela qual jogos como Tetris são tão viciantes é que eles
ativam um ciclo de recompensa perfeito no nosso cérebro. O ciclo de recompensa
é a estrutura (gatilho-ação-recompensa), e a dopamina é o combustível que te
faz percorrer esse ciclo repetidamente, criando a motivação e, eventualmente, o
vício”, explica Dra. Angie Pique Alboreda de Magalhães, professora do curso de
Psicologia da Estácio e especialista em construção de testes e Psicopatologia.
Segundo Angie, o prazer
imediato de encaixar blocos e completar linhas alimenta a vontade de continuar
jogando. “Basicamente, nosso cérebro prefere a satisfação imediata de resolver
um problema simples e claro, como encaixar blocos, em vez de lidar com as
tarefas complexas e de longo prazo da vida real. Esse vício é reforçado pelo
‘hiperfoco’, um estado de concentração tão profundo que o mundo ao redor
desaparece. Quando a gente perde, essa imersão é quebrada de forma brusca, o
que gera uma pequena frustração”, aponta.
O diagnóstico do
distúrbio, de acordo com a OMS, não é simples e precisa ser feito por
especialistas. Ainda assim, alguns sinais devem servir de alerta para
familiares e educadores, como o isolamento social, a irritabilidade ao
interromper o jogo, a perda de interesse por outras atividades e a queda no
desempenho escolar ou profissional. O vício em jogos pode atingir qualquer
idade, mas preocupa principalmente entre crianças e adolescentes, cuja formação
cognitiva e emocional ainda está em desenvolvimento.
Embora os jogos
eletrônicos possam estimular habilidades cognitivas e coordenação motora,
especialistas reforçam a importância do uso moderado e consciente. A discussão
entre pais, jovens e até idosos jogadores é fundamental para estabelecer
limites, evitar o uso excessivo e, quando necessário, buscar ajuda
profissional.
